São Paulo possui a maior população carcerária do País e com o advento da Lei 15.552, de 12 de agosto de 2014, na teoria, passou a proibir as revistas vexatórias realizadas em dia de visitas.
A nova lei (15.552/14), aprovada pela Assembleia Legislativa Paulista em julho do ano passado foi sancionada pelo governador Geraldo Alckmin e publicada no Diário Oficial dia 13 de agosto de 2014.
A decisão seria uma grande vitória para os familiares dos mais de 190 mil presos do estado, que sofrem repetidas humilhações na entrada dos presídios nos dias de visita.
A lei proíbe veementemente que os estabelecimentos prisionais submetam os visitantes a procedimentos invasivos, como é o caso do desnudamento, dos repetidos agachamentos sobre um espelho e da inspeção anal e vaginal.
Para tanto, o parágrafo único do artigo 1º afirma que “Os procedimentos de revista dar-se-ão em razão da necessidade de segurança e serão realizados com respeito à dignidade humana”.
Pode-se dizer que essa lei seria um grande e inestimável avanço na defesa da dignidade da pessoa humana, justamente por reconhecer que a revista vexatória é uma prática humilhante e que deve ser imediatamente extinta da sociedade, se ela já estivesse sendo praticada pelos estabelecimentos prisionais.
Muitos são os presídios e os centros de detenções provisórias que simplesmente deram de ombro para aludida lei e nunca a colocaram em prática, de modo que a sensação é que nasceu morta, sem forças, sem eficácia e com sua vigência simplesmente ignorada.
Quando nasce uma lei, ela precisa sair do papel e ser posta em prática imediatamente, ela precisa ser concretizada no mundo real, o que definitivamente não aconteceu com a lei nº 15.552/14.
Segundo o texto sancionado pelo Governador Geraldo Alckmin, o governo teria "até" 180 dias para regulamentar a nova norma, conforme seu artigo 5º.
Este prazo, todavia, encerrou-se no início de fevereiro deste ano (2015) e ao que se sabe, nada de efetivo foi feito até agora.
Vale lembrar que quando da sanção governamental, o Governador Alckmin vetou parte do texto legal que estendia a proibição da revista vexatória também nos manicômios judiciais e em locais de internação de menores, como é o caso da Fundação Casa.
É imperativo que a luta pela manutenção da Dignidade da Pessoa Humana continue, especialmente por ser ilógico proibir a violação a um grupo e não o fazer a outro. Óbvio que da mesma forma que foi proibido a revista vexatória aos estabelecimentos prisionais, embora na prática ainda nada tenha sido implementado, também deveria ter sido proibido nos manicômios judiciais e nos locais de internação de menores infratores.
O Governador também vetou do texto parte que impedia a revista mecânica e eletrônica de gestantes e pessoas portadoras de marca-passo. Com isso, na prática, ficou obscuro como serão os procedimentos adotados para que estas pessoas possam visitar seus familiares e amigos, já que a lei sancionada não esclarece como essas pessoas poderão ingressar no estabelecimento prisional.
São Paulo não foi o primeiro Estado a adotar a proibição da revista vexatória e pelo andar da carruagem na regulamentação da lei, talvez seja o último a colocá-la em prática.
Pelo menos em nove estados brasileiros foram baixadas normas que proíbem a realização de revista íntima para ingresso em unidades prisionais. Na revista que condicionou-se chamar de vexatória o visitante é obrigado a ficar nu, agachar-se e ter as partes íntimas inspecionadas.
Incontáveis foram as vezes que o Conselho Nacional de Justiça e outras instituições recomendaram o fim desse procedimento, por considerá-lo ofensivo aos direitos individuais garantidos pela Constituição Federal.
É indiscutível que tal revista ofende a individualização da pena e é um grave atentado aos Direitos da Pessoa Humana do visitante.
No ano passado, em 2 de setembro, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) publicou a Resolução nº 5, de 28 de agosto de 2014 determinando a substituição da revista íntima pelo uso de equipamentos eletrônicos detectores de metais, aparelhos de raios X, scanner corporal, entre outras tecnologias capazes de identificar armas, explosivos, drogas e outros objetos ilícitos. A norma substitui outras duas resoluções do colegiado, de 2000 e 2006, igualmente contrárias à revista vexatória.
Imperioso destacar que a primeira unidade da Federação a proibir o procedimento foi Minas Gerais, por meio da Lei Estadual nº 12.492/1997 e uma das mais recente foi no Amazonas, onde, em 21 de agosto do ano passado, o Juiz de Direito, Dr. Luís Carlos de Valois Coelho, Titular da Vara de Execuções Penais do Estado, assinou a Portaria nº 007/14/VEP, que proíbe a prática na capital Manaus.
Dados do Núcleo Especializado em Situação Carcerária e da Ouvidoria-Geral da Defensoria Pública do estado de São Paulo aponta que foram realizados em São Paulo 3.407.926 procedimentos de revistas íntimas vexatórias em todo estado em 2012 e em apenas 0,013%, foram encontrados aparelhos celulares e, em 0,01%, entorpecentes, sendo que em nenhum caso houve apreensão de armas.
Conforme matéria divulgada no site do CNJ, outros estados também baixaram normas contra a revista vexatória, entre eles, Paraíba (Lei Estadual nº 6.081/2010), Rio de Janeiro (Resolução nº 330/2009 da Secretaria de Administração Penitenciária), Rio Grande do Sul (Portaria nº 12/2008 da Superintendência dos Serviços Penitenciários), Santa Catarina (Portaria nº 16/2013 da Vara de Execução Penal de Joinville), Espírito Santo (Portaria nº 1.575-S, de 2012, da Secretaria de Estado da Justiça), Goiás (Portaria nº 435/2012 da Agência Goiana do sistema de Execução Penal) e Mato Grosso (Instrução Normativa nº 002/GAB da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos).
Em alguns mutirões carcerários, o CNJ verificou a prática de revistas vexatórias mesmo em Estados que tal prática já eram proibidas, como, por exemplo, o mutirão realizado no Presídio Central de Porto Alegre (PCPA) no período de fevereiro a março de 2014. Na oportunidade o CNJ flagrou a aplicação do procedimento, apesar de ele ter sido proibido pela Portaria nº 12/2008 da Superintendência dos Serviços Penitenciários do Rio Grande do Sul (Susepe).
Segundo informações colhidas no site do próprio CNJ, o relatório do mutirão, aprovado pelo Plenário do Conselho em 16 de junho de 2014, na 191ª Sessão Ordinária, somente os visitantes dos líderes das facções criminosas que controlam o PCPA estavam livres da revista. A regalia, segundo constatou o CNJ, tinha a anuência da Brigada Militar, que administra a unidade. Os demais visitantes, no entanto, precisavam chegar à unidade às 5 horas, passar por todos os procedimentos de segurança, até chegar, por volta das 11 horas, às galerias.
Na toada de acabar com a revista vexatória, São Paulo editou lei que a proíbe, agora falta por em prática tal determinação. O prazo já estourou e nada de concreto foi posto em prática. Estamos ansiosos e atentos contando que a Defensoria Pública Paulista, o Ministério Público, na qualidade de guardião da Lei e o Juízo das Execuções cobrarão a efetivação da lei. Quando isso acontecer, São Paulo terá dado um grande salto no respeito à Dignidade da Pessoa Humana e na Individualização da Pena.
Welington Araujo de Arruda é Advogado, Mestrando em Direito, Justiça e desenvolvimento pelo IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público), possui MBA em Gestão Política e Governamental pela EPD (Escola Paulista de Direito) e foi Graduado em Direito pela Faculdade de Direito Ibmec/Damásio.
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